quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Entra

Desencontros marcados no vazio.
Fico aqui... À espreita de tudo,
com ventos gélidos de esperança,
à porta da noite em que disseste que entravas.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Um todo

Calados entre o sopro de bocas letais,
deciframos as ondas que passeiam rasteiras.
 ...
Evitamos quebrar o espesso calor
que inunda o espaço vazio de nós.

Vigília

Navios de brasas quentes de insónia.
Pensamentos dormentes de tensos repousos.
Mantas de luz atravessadas de espinhos,
em olhares carregados com o peso do mundo.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Horas

Quebrado pelas horas,
em mantos de sonhos.
Entre abraços famintos,
e palavras de encanto.

Eu era apenas um fim,
que não queria só meu.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Tempo lento

O descanso que retoma a sua força,
dos espaços curvos do tempo,
onde tudo se esgota, em câmara lenta.

Conserto as palavras que lancei,
alcanço o espaço que perdi.

Desperto pelo nada esperar.

Ode 101

Adensam-se as horas.

Atravesso a espessura dos dias,

e olho o livro que grita em silêncio o teu nome.

Ser desejo

Ser possível rasgar o rosto que enfrenta a verdade.

Despejar todas as centelhas de luz aprisionadas, e entender o desencanto!

Confiar cegamente na alma.

Arrefecer o corpo.

Fechar as portas ao calor e enfrentar a imensidão desconhecida das dúvidas.

Sonhar é tudo e não é nada.

Apenas restos de memórias desejosas de ser.

A viagem

Carlos verificou o ponteiro da gasolina.
Os dias estão cada vez mais curtos.
Decide apontar o carro em direcção ao posto de abastecimento mais próximo. Uma paragem depois de duas horas de viagem. O sono já pesa e a noite torna a auto-estrada monótona.
Seis da manhã.
Para trás fica a noite.
Neste sentido o sol ficou laranja, preparando o dia para o calor.
A rádio ilumina-se.
Espera-se que as temperaturas atinjam os 39º no interior…
O pé desce e o ponteiro sobe.
A recta é longa e o sol já começa a arder em direcção ao asfalto. É preciso parar.
Para dominar o medo da próxima hora, puxa de um cigarro, abre a janela e assobia.
I’ve got you under my skin.
Vem-lhe à cabeça o sorriso estúpido da quarentona de cabelo armado em forma de algodão-doce. Os olhos abertos. A adorar.
Só quando lhe espetou a chave de fendas no recto e lhe desfez a mama com um alicate é que ela realmente gritou de prazer. Até ali parecia uma boneca insuflável, sempre com a mesma repugnante expressão de quem está disposta a tudo.
O que custa mais é tocar-lhes.
Detesto tocar-lhes no rosto ou nas nádegas.
Que calor.
Gosto de sentir a carne dos seios a rasgar. O som é indescritível.
A estação de serviço estava deserta. Mal saiu do carro reparou que o sol já estava alto. É um prazer respirar o cheiro quente da gasolina.
Desde pequeno que sentia um prazer irresistível em encher uma seringa de gasolina e injectá-la nas galinhas da vizinha. Morriam em poucas horas, depois de correrem o galinheiro aos saltos. A vizinha ficava estarrecida ao ver as galinhas saltar dois metros no ar e caírem redondas no chão, desamparadas. Pensava que era bruxaria e não se atrevia a comê-las. Queimava-as por trás do muro do quintal, na sucata, entre as carcaças ferrugentas dos automóveis e o emaranhado selvagem das silvas.
Também não gosto das suas barrigas salientes, redondas e moles.
Quando a pontapeou na barriga, ela soltou um grito abafado que mais parecia um vómito.
Tudo nelas é apenas gordura, dentes podres, pus e estupidez.
Decidiu tomar um café. A viagem ainda ia ser longa e assim passava uma vista de olhos pelo jornal.
Nada!
Talvez ainda não a tivessem encontrado.

Prólogo

Tenho a certeza de que estou a morrer.
Tento entender as razões que me levam a dizer isto e não as consigo encontrar.
Já me perguntaste o que tenho.
Se for uma doença qualquer desconhecida dou-lhe o teu nome.