domingo, 12 de agosto de 2012

a razão do silêncio


soltaste uma gargalhada
todos se calaram
quais os pensamentos que os percorrem? pensas.
retomas a posição original
olhas o silêncio e a conversa continua
tu não
ficas parado nesse instante
percorres teias de razões
sem encontrar uma que te salve
estás exposto
um momento pode ser eterno
tal como o segundo que leva a mosca a cair na teia
não tiveste tempo para dizer adeus
e quanto mais te moves mais te denuncias

pouco a pouco


desponta o sol quando o frio insiste em me perseguir.
começa pela ponta dos dedos dos pés e invade-me o corpo
pouco a pouco
sinto o frio a percorrer-me os braços
a chegar onde nunca poderão chegar as tuas mãos
deixo-me ficar por aqui estendido
percorrido pela ausência
entorpecido
não tenho forças para derramar lágrimas
o frio leva tudo
a vontade de amar
a vontade de sonhar
dedico-me à solidão
à solidão das palavras escritas
viver impede-nos de sonhar
e este frio impede-me de viver

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Contagem decrescente

Tinha-a visto sair apressada. As botas, o gorro, o casaco e passos largos para acompanhar o bicho. Teria tempo de a apanhar na próxima curva, antes de chegar ao café, se calçasse as botas, enfiasse o chapéu, saltasse as escadas duas a duas e contornasse o prédio pela esquerda. O cachorro pararia, pelo menos, vinte vezes, para deixar o seu cheiro pelo caminho. Teria de ser rápido. Entrou no café, encostou-se ao balcão e ficou a olhar a porta. Passaria dentro de momentos por ali. Ele sabia-o. Todos os fins da tarde. O mesmo percurso. Café? Sim, respondeu sem olhar. Mais alguns segundos. Doze, onze, dez, nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três

dois, uma contagem decrescente para uma crescente ânsia de lhe falar. Entrar dentro dos seus olhos, como quem penetra no abismo, e procurar, em todos os recantos, as suas orgânicas criaturas. Seres disformes que escondemos dentro de nós e que temos receio de revelar. Figuras indescritíveis. Corpos trucidados por comboios. Olá, dir-lhe-ia.

um, e o que se seguiria? Não encontrou mais nada, além dessa breve e ridícula introdução de conversa.

zero.

Mateus desapareceu

Mateus desapareceu.
Abriu a porta de casa, entrou e nunca mais foi visto.
Já tentaram de tudo para o fazer aparecer, mas sem sucesso.
Continua desaparecido e assim ficará,
enquanto se lembrarem dele.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Póstumas

As intermináveis imagens
de suspeitos encontros.
Espelhos suspeitos de homicídio.
Carnívoros flocos de neve
que se adensam a meus pés.

Desfiz as linhas da razão!
Pintei as imagens que teimam em pairar sobre o nós.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Palavras

Insondáveis pedras:
- Encontro-me entre as que te digo
e as que me atiras a mim!

Vórtice

Encontro-me afastado.
Perto do que está longe.
Perdido em distantes presenças.
Indiferente ao espaço que me envolve
e das rotinas abandonadas por ti.

Entre candelabros baços pelo tempo
e restos de imagens presas pelo chão.
Vagueio pela casa aos tropeções,
esquecido dos espaços vazios que um dia
pensei ser apenas só meus.

Enfrento as vagas que me tolhem os ombros,
tentativas vãs de encontrar um repouso.
Liberto os braços de encontro aos teus ventos,
tufões que lançaste e deixaste por cá.